O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) pediu nesta quarta-feira (28) que a corte investigue se o presidente Jair Bolsonaro utilizou órgãos do governo federal para “causar embaraços e dificultar” apurações da Receita Federal sobre o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ).
Na representação, o subprocurador Lucas Furtado cita, especificamente, a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência (GSI).
Segundo reportagem da revista “Época”, advogadas de Flávio Bolsonaro mobilizaram órgãos do governo em busca de elementos que permitissem a anulação das investigações envolvendo Fabrício Queiroz, ex-assessor do parlamentar, no caso das “rachadinhas”.
A reportagem relata uma conversa em 25 de agosto, no Palácio do Planalto, entre o presidente Jair Bolsonaro e as advogadas Luciana Pires e Juliana Bierrenbach. Apesar da suposta mobilização, segundo a revista, os órgãos não encontraram as tais irregularidades.
“É difícil crer, no entanto, que autoridades do primeiro escalão da administração federal das áreas de inteligência e segurança institucional possam estar encarregadas de receber denúncias da natureza das que ora se cogita, relacionadas a ilícitos tributários e respectivas investigações”, diz trecho da representação de Lucas Furtado.
O subprocurador afirma que, se confirmadas as suspeitas, a ação de Bolsonaro pode ser caracterizada como desvio de finalidade pública. Neste caso, caberia ao TCU apurar o prejuízo causado ao patrimônio público e a responsabilidade dos envolvidos, além de aplicar sanções.
O desvio de finalidade seria caracterizado, para Furtado, porque a Abin e o GSI não atuariam dessa maneira em favor de nenhum outro cidadão. O favorecimento de interesses particulares da família Bolsonaro também representaria crime de responsabilidade, por atentar contra a segurança interna do país e a probidade na administração pública.
O subprocurador Lucas Furtado afirma ainda que a suposta interferência também constituiria “ocorrência de extrema gravidade” com implicações comuns e de responsabilidade, mas que a apuração dessas irregularidades não cabe ao TCU.
Suposta mobilização
Segundo a “Época”, ao ser acionado pelas advogadas, Jair Bolsonaro convocou para o encontro o ministro Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), e Alexandre Ramagem, diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).
A defesa do Flávio Bolsonaro afirma que, para produzir relatórios, funcionários da Receita teriam violado direitos do senador. As informações que embasaram documentos de inteligência do antigo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), atualmente chamado de Unidade de Inteligência Financeira.
Um desses documentos revelou o esquema que, de acordo com o Ministério Público Federal, teria a participação de Flávio Bolsonaro, filho do presidente: o desvio de dinheiro público na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) por meio das “rachadinhas”, a prática de parlamentares de pegar de volta parte do salário dos funcionários.
O Sindicato dos Auditores Fiscais (Sindifisco) afirmou em nota, na última semana, que a Receita Federal não repassa informações ao Coaf — ocorre exatamente o contrário. O Coaf é o órgão que produz os relatórios de inteligência financeira, os chamados RIFs, com base em informações fornecidas pelas instituições financeiras obrigadas a informar movimentações financeiras atípicas ao órgão.
O que dizem os órgãos
Em nota divulgada à imprensa na sexta-feira (23), o GSI disse não realizou qualquer ação em relação ao caso. O órgão afirmou que entendeu que não lhe competia qualquer providência a respeito do tema.
Na nota, o GSI declarou que recebeu informação, das advogadas Luciana Pires e Juliana Bieerenbach, acerca de supostas irregularidades cometidas em relatórios da Receita Federal. Segundo o gabinete, as advogadas disseram que as denúncias foram levadas ao GSI por “atingir integrante da família presidencial”.
“Entretanto, à luz do que nos foi apresentado, o que poderia parecer um assunto de segurança institucional, configurou-se como um tema, tratado no âmbito da Corregedoria da Receita Federal, de cunho interno daquele órgão e já judicializado”, diz o texto.
A Agência Brasileira de Inteligência não se manifestou sobre a presença de Alexandre Ramagem na reunião descrita pela revista “Época” e mandou a mesma nota enviada pelo Gabinete de Segurança Institucional.
Segundo o G1, a Receita Federal não quis se manifestar.
Foto: Marcos Corrêa.