A força-tarefa da operação Lava Jato, em Curitiba, repudiou, na tarde desta quarta-feira (29), as declarações dadas pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, que afirmou em um debate virtual que é hora de ‘corrigir rumos’ para que ‘lavajatismo não perdure’.
As declarações foram feitas por Aras, na terça-feira (28), durante uma participação em um debate virtual, promovido por um grupo de advogados.
Durante fala no debate virtual, o procurador-geral da República afirmou que a “correção de rumos não significa redução do empenho no combate à corrupção” e disse que não pode existir “caixa-preta” no MP.
Segundo a força-tarefa, do Ministério Público Federal (MPF) no Paraná, as declarações de que existem ‘caixas de segredos’ no trabalho dos procuradores e de que “haveria milhares de documentos ocultos” são falsas.
“Não há na força-tarefa documentos secretos ou insindicáveis das Corregedorias. Os documentos estão registrados nos sistemas eletrônicos da Justiça Federal ou do MPF e podem ser acessados em correições ordinárias e extraordinárias”, destacaram.
‘Ataques infundados’
Na nota, a força-tarefa destacou que devem ser rejeitados o que classificou como “ataques genéricos e infundados às atividades de procuradores da República”, além de “tentativas de interferir no seu trabalho independente”.
“A independência funcional dos membros do Ministério Público transcende casos individuais e é uma garantia constitucional da sociedade brasileira de que o serviço prestado se guiará pelo interesse público, livre da interferência de interesses diversos por mais influentes que sejam”, diz a nota.
No evento virtual, Aras afirmou que a força-tarefa da Lava Jato no Paraná tem 300 terabytes em informações, além de 38 mil pessoas investigadas e sem critérios.
Em resposta, os procuradores de Curitiba disseram que a afirmação se trata de uma “falsa suposição”, considerando que esse é o número de pessoas físicas e jurídicas mencionadas em relatórios encaminhados pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) ao MPF, em suspeita de crimes de lavagem de dinheiro.
“Ao longo de mais de 70 fases ostensivas e seis anos de investigação foi colhida grande quantidade de mídias de dados – como discos rígidos, smartphones e pendrives – sempre em estrita observância às formalidades legais, vinculada a procedimentos específicos devidamente instaurados”, ressaltou a força-tarefa.
Ainda na noite de terça-feira, o procurador Roberson Pozzobon, integrante da força-tarefa de Curitiba, já havia criticado a declaração de Aras em uma rede social.
“A transparência faltou mesmo no processo de escolha do PGR pelo presidente Bolsonaro. O transparente processo de escolha a partir de lista tríplice, votada, precedida de apresentação de propostas e debates dos candidatos, que ficou de lado, fez e faz falta”, publicou.
Conflito
Augusto Aras entrou em atrito com as forças-tarefa depois de a chefe da Lava Jato na PGR, Lindôra Araújo, se dirigir a Curitiba com o objetivo de obter acesso a dados de investigações.
Segundo o G1, o conflito envolveu o repasse de dados sigilosos da força-tarefa do Paraná à PGR, que recorreu ao Supremo Tribunal Federal para ter acesso às informações e obteve decisão a favor do compartilhamento de dados.
Após a decisão, técnicos da Procuradoria-Geral da República estiveram em Curitiba para buscar os dados de toda a investigação.
Força-tarefa de São Paulo
Procuradores da força-tarefa da Lava Jato em São Paulo também rebateram as afirmações de Aras. A equipe disse que “a distribuição dos processos é realizada nos estritos termos da Portaria PGR nº 23/2020”.
De acordo com a nota, a distribuição dos processos segue critérios de verificação de processos correlatos, análise de conexão, continência, prevenção, “sempre com a observância dos normativos internos da unidade, os termos da Portaria do Procurador-Geral da República e as disposições do Código de Processo Penal”.
Ainda segundo a nota dos procuradores de São Paulo, a Corregedoria-Geral do MPF realizou, no primeiro semestre do ano passado, uma correição ordinária em todos os feitos judiciais e extrajudiciais da força-tarefa da Lava Jato.
Em janeiro deste ano, de acordo com os procuradores, foi realizada uma correição extraordinária nas 23 forças-tarefa existentes no MPF, incluindo a do estado paulista, que prestou à corregedora-geral do MPF “todas as informações solicitadas”.
Nas duas situações, segundo a nota, nenhuma irregularidade foi encontrada.
Leia, abaixo, a íntegra da nota divulgada pela força-tarefa do Paraná:
“Os procuradores da República integrantes da força-tarefa constituída pelo Ministério Público Federal para atuar na operação Lava Jato repudiam as declarações infundadas lançadas em “live” realizada na noite de 28 de julho de 2020, com a participação do Procurador-Geral da República e advogados que patrocinam a defesa de influentes políticos e empresários investigados ou condenados na operação Lava Jato.
1. Devem ser refutados os ataques genéricos e infundados às atividades de procuradores da República e as tentativas de interferir no seu trabalho independente, desenvolvido de modo coordenado em diferentes instâncias e instituições.
A independência funcional dos membros do Ministério Público transcende casos individuais e é uma garantia constitucional da sociedade brasileira de que o serviço prestado se guiará pelo interesse público, livre da interferência de interesses diversos por mais influentes que sejam.
2. A ilação de que há “caixas de segredos” no trabalho dos procuradores da República é falsa, assim como a alegação de que haveria milhares de documentos ocultos. Não há na força-tarefa documentos secretos ou insindicáveis das Corregedorias.
Os documentos estão registrados nos sistemas eletrônicos da Justiça Federal ou do Ministério Público Federal e podem ser acessados em correições ordinárias e extraordinárias. As investigações e processos são ainda avaliados pelas Corregedorias e pelo Poder Judiciário, pelos advogados de investigados e réus e pela sociedade.
3. A extensão da base de dados só revela a amplitude do trabalho até hoje realizado na operação Lava Jato e a necessidade de uma estrutura compatível.
Ao longo de mais de setenta fases ostensivas e seis anos de investigação foi colhida grande quantidade de mídias de dados – como discos rígidos, smartphones e pendrives – sempre em estrita observância às formalidades legais, vinculada a procedimentos específicos devidamente instaurados.
Para que se tenha ideia, por vezes apenas um computador pessoal apreendido possui mais de 1 terabyte de informações.
4. É falsa a suposição de que 38 mil pessoas foram escolhidas pela força-tarefa para serem investigadas, pois esse é o número de pessoas físicas e jurídicas mencionadas em Relatórios de Inteligência Financeira encaminhados pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) ao Ministério Público Federal, a partir do exercício regular do seu trabalho de supervisão de atividades suspeitas de lavagem de dinheiro.
5. Investigações de crimes graves que envolvem políticos e grandes empresários desagradam, por evidente, parcela influente de nossa sociedade, que lança mão de todos os meios para desacreditar o trabalho até então realizado com sucesso.
Nesse contexto, é essencial que as Instituições garantam a independência funcional dos membros do Ministério Público, conforme lhes foi assegurado pela Constituição de 1988″.
Foto: Pedro França.