Universitários que conseguirem, temporariamente, fraudar o sistema de seleção por cotas sociais e raciais e forem denunciados e condenados pelo crime podem ter que ressarcir os cofres públicos pelas mensalidades que teria que ter pago em uma instituição privada de ensino. A informação é do Ministério Público Federal do Rio de Janeiro (MPF-RJ). Atualmente, quatro estudantes da UFRJ e dois da Unirio enfrentam ações civis públicas apresentadas pelo órgão no estado. Já quanto aos profissionais já formados, mesmo que tenham burlado o sistema, o órgão esclarece que não há previsão legal para cassação ou suspensão dos diplomas emitidos.
Com os crescentes protestos antirracistas que se tornaram pauta mundial neste mês de junho, não apenas instituições de ensino, mas o próprio MPF recebeu diversas representações da sociedade civil denunciando fraudes em cotas raciais usadas para ingresso em universidades públicas. O movimento foi ampliado após a polêmica do perfil Fraudadores de Cotas, que estimulava a exposição anônimas de pessoas com fenótipos de brancos e com histórico de privilégios que haviam se autodeclarado negras, pardas ou enquadradas em benefícios relacionados à baixa renda familiar. A conta passou menos de 48h no ar e provocou debate expondo nomes que incluíam um universitário que assumiu a transgressão e uma indígena que já tinha tido problemas para provar sua descendência à universidade.
De acordo com o Ministério Público Federal, apesar do foco no tema, já há um trabalho sistemático para evitar fraudes no sistema seletivo. “Nos últimos anos, o MPF recomendou que os institutos e universidades federais do Rio de Janeiro instaurassem comissões de verificação prévia ao ingresso de candidatos que se declaram cotistas. Devido a esta atuação, tais comissões existem hoje em todas as instituições federais de ensino do estado”, afirma o órgão em nota enviada ao Correio.
Segundo o Correio Braziliense, uma vez que a fraude seja comprovada, independentemente do quão avançado esteja o curso do estudante universitário, cabe à instituição de ensino jubilá-lo ou anular suas matrículas. O mesmo pode ser feito por meio de ação judicial, por um procurador, caso a universidade não tome providência. No caso de condenação, mesmo que o estudante tenha que ressarcir financeiramente os cofres públicos pelas mensalidades que deixou de pagar, é possível que ele seja responsabilizado também na esfera penal.
As denúncias são recebidas pela ouvidoria do MPF pelo site da instituição, no endereço http://mpf.mp.br/servicos/sac. Registros relacionados à exposição de estudantes nas redes sociais foram recebidas pelo órgão, que garante que cada caso já está sob apuração e alerta que “a repetição de representações nesse sentido pode comprometer a agilidade pela necessidade de nova análise de cada situação”.
Recomeço possível
No Brasil, as regras de jubilamento e anulação de matrícula variam entre instituições. No entanto, o fato de ter a continuidade do curso comprometida não significa que a formação do universitário não possa ter continuidade, em caso de ele passar por novo processo seletivo, por vias regulares, e ser aprovado – dessa vez, como novos vínculo e matrícula. Foi o que fez o estudante de direito Ruan Carlos, um dos denunciados pelo perfil Fraudadores de cotas que assumiu a transgressão em uma vaga na UFRJ publicamente.
“Sou eu. Eu sei que já fiz merda, e não escondo minha cara por isso. Aí eu tinha 16 anos. E depois saí da faculdade, abandonei essa matrícula e reingressei com outro Enem e uma regular. Ja sofri retaliação e exposição desde o início e acho que isso é necessário mesmo pra que não se repita hoje”, escreveu o jovem, que agora cursa direito na Universidade Federal Fluminense, de Niterói (RJ). “Isso não é um segredo, eu já fui exposto desde o início e é por poder ter conversado com as pessoas e ter entendido que eu tinha feito merda, que eu abandonei a vaga”, declarou.
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