“Vim para a faculdade só para conseguir usar o Twitter”, escreveu uma aluna da Universidade de São Paulo (USP) na manhã de segunda-feira (2). Na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), outra estudante também comemorou que o X “estava vivo” por lá — e postou até tutorial no TikTok de como acessá-lo.
Aos poucos, alunos de faculdades brasileiras de diferentes estados perceberam que, pelo Wi-Fi das instituições de ensino, a rede social não havia sido bloqueada mesmo após a suspensão ordenada no último sábado (31) pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Abaixo, entenda a explicação para isso e saiba se o acesso permanece liberado nesses locais.
Mas por quê? Existe um serviço internacional gratuito de Wi-Fi, chamado de “Eduroam”, que possibilita a conexão de alunos e professores à internet sempre que estiverem nos lugares cadastrados no programa.
Um estudante da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), por exemplo, pode usar seu login e sua senha para acessar o Wi-Fi da Universidade de Cambrige, quando for à Inglaterra, ou da Universidade de Toronto, em uma viagem ao Canadá.
E é aí que entra a solução do mistério: a “Eduroam” é uma rede independente, com fins acadêmicos, e não está sob a jurisdição da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). É como se, para proteger os dados dos usuários e garantir o acesso a documentos internos (como uma apostila de um curso, por exemplo), ela andasse em uma “faixa exclusiva” no “trânsito da internet”.
“[A Eduroam] tem uma conexão direta com o Twitter, que não passa exatamente pelas operadoras de internet cadastradas na Anatel”, explica Thiago Ayub, diretor de tecnologia da empresa de telecomunicações Sage Networks.
Os alunos ainda estão conseguindo acessar o X nas faculdades? Na maior parte dos casos, não. A “farra” durou pouco.
Na USP, por exemplo, o bloqueio entrou em vigor ao meio-dia de segunda-feira.
Segundo a Rede Nacional de Pesquisas (RNP), que administra a “Eduroam” no Brasil, o X foi bloqueado nas universidades e instituições de pesquisa no início da tarde de segunda-feira (2), “assim que se tornou pública a decisão da 1ª turma do STF de suspender a rede social”, informou a empresa ao g1.
“Caso [ainda] ocorram acessos o X por universidades e outras instituições de pesquisa, a conexão com a internet não tem relação com a RNP.”
Quem foi à faculdade nesta terça (3) com a pretensão de usar a rede de Elon Musk ficou frustrado. “Eduroam bloqueou o Twitter e deixou os universitários na mão 😭😭”, postou um aluno.
E no trabalho? Por que ainda tem gente acessando o X?
Relatos no Downdetector, site que monitora o funcionamento de serviços on-line, apontam casos de funcionários de empresas que conseguem usar o X por meio do serviço de VPN (sigla em inglês para “rede privada virtual”) corporativa, voltada para acessar sistemas do trabalho, por exemplo.
“Na VPN, os dados não passam pela internet pública. As empresas usam esse recurso para trocar documentos confidenciais. É uma rede toda criptografada, onde só entra quem está autorizado”, explica Carlos Neves, professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) e arquiteto de software da ferramenta Smooh.
É uma espécie de túnel criado para conectar o computador ou o celular do funcionário diretamente à rede corporativa. Se o fornecedor de internet contratado pela companhia ainda não realizou o bloqueio do X, será possível acessar a plataforma por meio desta conexão.
De forma geral, isso acontece por conta de um dos motivos abaixo:
-O provedor começou, mas ainda não concluiu o bloqueio – a Anatel diz que notificou as empresas e que elas têm até cinco dias para derrubar o acesso ao X, apesar de este prazo não estar previsto na ordem de Moraes (veja nota ao final).
-O provedor optou deliberadamente por não bloquear o X e não cumprir a decisão do ministro, como disse a Starlink, serviço de internet via satélite do bilionário Elon Musk, que também é dono da rede social.
-O provedor recebeu a notificação, mas cometeu algum erro no bloqueio que fez o acesso não ser cortado de forma completa.
“Há empresas que receberam o comunicado, executaram o bloqueio, mas o fizeram de forma ineficaz. Aí, alguns clientes acabam acessando acidentalmente”, explica Ayub.
Em casa, provedores locais de internet podem acessar o X?
Usuários também afirmam que ainda conseguem acessar o X em casa e sem VPN, porque assinam planos de internet junto a provedores locais de internet. Nestes casos, é possível que as empresas ainda não tenham concluído o bloqueio que já foi feito por provedores maiores.
A Conexis Brasil Digital, que representa as operadoras Claro, Tim, Vivo, Oi, Algar Telecom e Sercomtel, disse na última sexta (30) que “as suas associadas confirmam o recebimento da notificação e cumprirão decisões judiciais aplicáveis às suas redes”.
A TelComp, que representa mais de 50 operadoras, incluindo provedores regionais, afirmou que todas as suas associadas receberam a notificação e seguiram com o bloqueio”.
Veja a íntegra da nota da Anatel:
“A Anatel teve 24 horas (a partir do recebimento da ordem do ministro Alexandre de Morais) para notificar as prestadoras. As empresas foram notificadas dentro do prazo. A Agência informou o cumprimento ao STF, às 17h, de sábado. As prestadoras têm até 5 dias (após a comunicação da Anatel) para derrubar o acesso ao X.
A partir de hoje, dia 02/09, a fiscalização da Anatel está verificando o cumprimento da ordem por parte de mais de 20 mil empresas.”
Foto: Gabby Jones.