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Para investigadores e ministros do STF, Cid está pressionado e faz jogo duplo para tumultuar as investigações

Os áudios em que ataca o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e a Polícia Federal (PF) fazem parte de uma estratégia de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL) para tentar tumultuar as investigações contra si e o ex-presidente, avaliam integrantes da corte e da corporação.

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Cid, que foi detido em maio de 2023 na operação que investigava a emissão fraudulenta de cartões de vacina para Bolsonaro e outras pessoas, fez um acordo de delação premiada com a Polícia Federal (PF) para poder deixar a cadeia.

Desde então, essa colaboração foi usada pela PF em diversas frentes de investigação, como as que apuram se o ex-presidente desviou joias da União em benefício próprio se tentou dar um golpe de estado para se manter no poder mesmo com a derrota nas urnas em 2022.

Na quinta-feira (21), a revista “Veja” divulgou áudios atribuídos a Cid. Neles, segundo a revista, o ex-ajudante-de-ordens diz que os investigadores da PF “não queriam saber a verdade” e que Moraes “está com a sentença pronta” para condenar investigados.

Não é possível saber se Cid fala com alguém e quem é essa pessoa.

Como a delação está em sigilo, Cid não pode discuti-la com ninguém (a não ser advogados e investigadores) e, por isso, o episódio pode levar à anulação da colaboração, o que poderia levar o ex-ajudante de ordens de volta à prisão.

Uma dúvida também a ser apurada é se houve combinação desses áudios com advogados de outros investigados, o que poderia configurar obstrução de Justiça.

Após a revelação dos áudios, Moares determinou que Cid seja ouvido por um juiz auxiliar. O depoimento foi marcado para as 13h desta sexta-feira (22). A defesa e um representante da Procuradoria-Geral da República (PGR) vão participar.

O movimento, assim, é arriscado, mas Cid de ordens está pressionado pelo entorno bolsonarista, que quer saber se ele falou o que tem sido divulgado sobre a delação. Os áudios divulgados pela Veja, assim, foram vistos com bons olhos nesse grupo – apesar de trazerem também críticas a Bolsonaro (“O presidente teve Pix de milhões, ficou milionário, né?”, disse Cid, segundo a revista.)

Ocorre que, ressalta um investigador da PF, nem tudo que está nas investigações saiu da boca de Cid. Na operação Tempus Veritatis, sobre a tentativa de golpe de Estado, os relatos do colaborador não foram prioritários, segundo a corporação.

“A colaboração não é a única e nem a mais importante prova que temos. Além do mais, o termo de colaboração e as outras provas obtidas a partir dele continuarão válidas, pois quem está dando causa à rescisão é ele”, diz outra fonte da PF.

Como o blog da Andréia Sadi mostrou, as reuniões para discutir uma tentativa de golpe de estado realizadas no final de 2022 no Palácio do Alvorada, residência oficial da Presidência da República, foram confirmadas por meio de registros de entrada e saída do local e de dados de celulares dos investigados, além dos depoimentos de participantes de peso, como o ex-comandante do Exército general Freire Gomes.

Uma eventual anulação da delação, assim, não invalidaria as investigações, na visão de integrantes da PF.

“[Cid] só tem a perder. A delação apenas corrobora as demais provas que temos… pouco traz de novo”, disse um uma fonte da corporação.

Sem delação, sem benefícios

Procurado pelo blog, o diretor-geral da Polícia Federal (PF), Andrei Rodrigues, disse que, após a divulgação dos áudios, reuniu equipes e encaminhou representação para Alexandre de Moraes “para que ele apure quem é o interlocutor e em que circunstância foi dito aquilo”. E também para apurar o que ele diz sobre a PF.

O chefe da PF explicou ainda que vai ter desdobramentos do caso.

Questionado a respeito de eventuais nulidades, Andrei explicou que “se anular a delação, o que se anula são os benefícios, porque o que ele disse pode ser aproveitado no processo”.

E que está tudo gravado em vídeo e áudio.

Defesa quer ‘amenizar prejuízos’

Procurado pelo blog, o advogado Cezar Bitencourt, que atua na defesa de Cid, disse que seu cliente não quer anular a delação e que a defesa vai trabalhar para remediar a situação.

“Não poderei abandoná-lo agora e terei que amenizar os prejuízos, que são grandes”, diz.

Questionado sobre qual seria a identidade do interlocutor no episódio dos áudios, ele fala que desconhecia. “Ainda não sei nada. Vou falar com ele às 13h, quando formos ao ministro Moraes”, completa Bittencourt.

Foto: Bruno Spada.

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