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Azul e preto ou branco e dourado? Quase 10 anos depois, vestido que viralizou continua gerando polêmica e é motivo de estudos

Para alguns, azul e preto. Para outros, branco e dourado. Você certamente se lembra de uma das maiores polêmicas de 2015: o famoso vestido (#TheDress, como ficou conhecido) que agitou a internet gerando debates sobre a real cor dele.

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Quase 10 anos depois, muitas pessoas ainda têm curiosidade no assunto e as discussões em torno do vestido seguem movimentando comunidades de neurociência, além de posts no X (ex-Twitter) e no TikTok, que nem existia na época do viral.

Mas por que até hoje o tal vestido promove embates?

O g1 conversou com um oftalmologista, uma neurocientista e um especialista em redes sociais. Eles afirmam que, passados todos esses anos, o caso ainda é estudado e o fenômeno está mais relacionado com nossas vivências.

“O entendimento de cor dos seres humanos tem relação com questões biológicas e também com suas experiências”, explica Flavio Mac, que é oftalmologista e diretor da Sociedade Brasileira de Oftalmologia (SBO).

Como tudo isso começou?

O rolo todo se iniciou na Escócia. Na loja do vestido, uma mulher chamada Cecilia Bleasdale enviou imagens para sua filha de algumas opções de roupa que ela poderia usar no casamento da jovem.

Bleasdale tirou três fotos, de três peças diferentes. “A terceira fotografia que enviei foi a do vestido infame”, disse ela em entrevista à BBC.

Referindo-se ao modelo que depois se tornou viral, a noiva então disse: “Este é lindo, mãe. O branco e dourado”. Cecilia, que enxerga azul e preto, estranhou a mensagem da filha e foi confirmar a cor com o marido, Paul Jinks, que também estava na loja.

Para a sua surpresa, Jinks não conseguiu observar nada de azul e preto ali, deixando a cabeça da esposa ainda mais confusa.

No dia da cerimônia, muitos dos convidados concordaram que o vestido realmente era azul e preto. Obviamente, não era uma unanimidade.

A filha de Cecilia, então, resolveu publicar a imagem da peça no Facebook. Já Caitlin McNeill, que fazia parte de uma banda de folk e tocou no tal casamento, também postou a foto no Tumblr, uma plataforma de blog (veja na imagem acima).

Em 48 horas, a postagem no Tumblr recebeu mais de 400 mil comentários, segundo o Know Your Meme, um portal on-line considerado a Wikipédia dos memes.

Depois dessas postagens, a polêmica escalou. No dia 26 de fevereiro de 2015, #PretoeAzul e #BrancoEDourado tomaram conta da internet, sendo um dos assuntos mais comentados no Brasil e no mundo no Twitter.

Até as estrelas Taylor Swift, Lady Gaga, Justin Bieber, Demi Lovato e Kim Kardashian se posicionaram, defendendo o que enxergavam ali.

Então, qual é a cor oficial?

Identificado como “Royal-Blue Lace Detail Bodycon Dress”, o vestido original é azul e preto. Ele foi produzido pela marca inglesa Roman Originals e custava 50 libras (algo em torno de R$ 300 hoje).

O g1 verificou que a roupa não está mais disponível para compra, mas a empresa mantém em seu site uma página exclusiva para tratar do assunto.

“O fenômeno revelou diferenças na percepção humana das cores que têm sido objeto de investigação científica contínua em neurociência e ciência da visão. Fizemos até uma versão #WhiteandGold (branco e dourado) que foi leiloada para caridade”, diz a Roman na página especial.

Segundo eles, após viralizar, em 48 horas, 3.622.960 pessoas acessaram sua loja on-line para ver o vestido e todas as unidades disponíveis foram vendidas em apenas 34 minutos. A #thedress foi usada em 2.214.343 postagens nas redes sociais.

João Finamor, professor de marketing digital da ESPM e especialista em redes sociais, diz que é natural que de tempos em tempos a discussão volte na internet e que seja estimulada por uma geração mais nova que só ficou sabendo da polêmica agora.

“Além disso, também há pessoas que relembram a história e vão para as redes defender o que enxergam”, afirma.

O caso do vestido não é o único a gerar debates. O Know Your Meme relembra que, em julho de 2015, a imagem de um sapato ao lado de dois esmaltes de tons de violeta gerou enorme repercussão nas redes por causa da cor.

Naquela ocasião, uma usuária do Twitter publicou a imagem (veja aqui) perguntando qual esmalte combinaria melhor com os sapatos. Mas algumas pessoas não enxergavam tons diferentes naqueles frascos, revivendo a polêmica das cores.

O que explica a divergência da cor?

Para o oftalmologista e diretor da Sociedade Brasileira de Oftalmologia (SBO), Flavio Mac, o caso do vestido é complexo porque envolve a percepção de cor pelas pessoas. E essa visão é subjetiva e não objetiva, explica.

A neurocientista Cláudia Feitosa-Santana conta que o efeito do #TheDress é inédito porque mostra que a nossa calibração de cor nem sempre funciona da mesma forma.

Cláudia pesquisa sobre o fenômeno do vestido desde o início e revela em seu livro “Eu controlo como me sinto: Como a neurociência pode ajudar você a construir uma vida mais feliz” (2021) que a divergência de cor tem mais a ver com fatores ambientais do que genéticos, segundo estudos.

“Existem pesquisas que levam a crer que a exposição com mais sol ou menos sol pode influenciar na nossa percepção de cores. E esses resultados também indicam que provavelmente a exposição a um céu azulado ou mais acinzentado pode modular a forma como percebemos as cores”, disse Cláudia em entrevista ao g1, em 2018.

Em um artigo para o Hospital Albert Einstein, a profissional exemplifica: se você nasceu em uma região em que a luz natural costumava ser mais quente, como amarelada ou alaranjada, então muito provavelmente você enxergará o vestido como azul e preto.

Flavio Mac concorda: “O histórico de vida da pessoa tem muito a ver. Por exemplo, o quanto ela foi exposta a ambientes mais ou menos iluminados. O quanto ela esteve exposta a cores diferentes na infância também vai influenciar na interpretação de cores na vida adulta”, diz o oftalmologista.

“O local onde a pessoa viu a foto interfere, mas não só isso. A idade, o humor da pessoa no momento da visualização, a memória e suas experiências passadas também contam”, completa.

Ao g1, Cláudia Feitosa-Santana conta que até hoje o vestido é analisado em grupos de neurociência. “Recentemente, tanto em Oxford quanto no Castle of Rauischholzhausen, na Alemanha, falamos sobre esse viral e continuamos estudando”, disse.

“A mensagem principal é aprender a respeitar que o outro pode ver de forma diferente e a percepção dele é tão válida quanto a nossa, pois a maneira como vemos é resultado da nossa história que engloba genética e ambiente de forma muito ampla”, finaliza a profissional.

Foto: Reprodução Google.

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