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O que pode acontecer se Israel e Hamas descumprirem resoluções do Conselho de Segurança da ONU

Após mais de um mês de guerra e cinco tentativas, inclusive por parte do Brasil, o Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) conseguiu aprovar na quarta-feira (15) uma resolução sobre a guerra entre Israel e o Hamas.

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A aprovação, no entanto, não significa o fim do impasse do conselho sobre a guerra. O desafio agora é garantir que os atores envolvidos nela – o governo de Israel e o grupo terrorista – cumpram as determinações exigidas no texto da ONU.

Isso porque, embora as resoluções do Conselho de Segurança sejam juridicamente vinculativas, na prática acabam ignoradas por muitos países.

A resolução aprovada, redigida por diplomatas de Malta, foi a que adotou um tom mais enfático: substituiu verbos como “apelar” por “exigir”.

O mecanismo, segundo fontes da diplomacia brasileira na ONU ouvidas pelo g1, foi utilizada justamente para aumentar a pressão sobre Israel e Hamas.

“O Conselho de Segurança…exige que todas as partes cumpram suas obrigações nos termos do direito internacional, incluindo o direito internacional humanitário, especialmente no que diz respeito à proteção de civis, especialmente crianças”, diz o texto.

No entanto, segundo os mesmo diplomatas, há possíveis consequências de caráter moral. Ao não adotar as medidas exigidas pela resolução – como uma pausa humanitária e mecanismos para garantir a proteção de crianças em Gaza – Israel entra em descumprimento internacional.

Como a Palestina não é citada na resolução, não há previsão de sanções nesse caso. O texto menciona o Hamas, grupo terrorista que controla a Faixa de Gaza, um dos dois territórios palestinos.

Sobre o Hamas, a avaliação é que a resolução de Malta coloca pressão sobre o grupo ao citá-lo no texto – esta foi a primeira proposta de resolução a fazer isso.

E que o descumprimento – neste caso, da entrega dos reféns – pode ter consequências para a futura denominação do grupo, que, na ONU, não é classificado como terrorista.

Os diplomatas ouvidos pelo g1 disseram ainda que o texto frisa que ambos os lados devem “observar as regras de direito humanitário internacional”

Não sendo reconhecido pela ONU como um interlocutor, o Hamas não poderia ser sancionado, mas há alternativas, explica Roberto Menezes, professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (IRel/UnB).

“Uma vez que o objetivo da resolução é fazer parar a máquina de guerra de Israel e a incursão militar na faixa de Gaza, o Conselho de Segurança pode impor a paz através do envio de tropas (capacetes azuis) sob o mandato da ONU”, afirmou.

Embora seja uma possibilidade, o envio de capacetes azuis não está em debate e não é citado na resolução.

O Conselho de Segurança poderia, ainda, impor um embargo de armas para toda a Palestina, diz Menezes. “Isso afetaria diretamente o Hamas. Nenhum país poderia vender ou fornecer armas para a região do conflito. O país que violasse o embargo poderia sofrer sanções, é gravíssimo.”

No caso de Israel, o status de descumprimento internacional pode afetar negativamente o país em decisões futuras, e prejudicar relações diplomáticas.

“(O descumprimento das resoluções) gera um mal-estar pelo descumprimento das normativas internacionais. Pode gerar também sanções políticas e morais, a piora das relações diplomáticas”, disse ao g1 a ex-juíza do Tribunal de Haia Sylvia Steiner – a única brasileira a integrar até hoje a Corte Internacional.

Um dos grandes gargalos é que Israel costuma ser apoiado pelos Estados Unidos, que, no Conselho de Segurança, têm poder de vetar qualquer resolução – o país é um dos cinco membros permanentes do conselho e, pelas normas, esses países têm poder de, sozinhos, vetar totalmente uma proposta, independentemente do número de votos favoráveis a ela.

“Uma resolução não tem força coercitiva. O que é mais falho no sistema jurídico internacional é exatamente o mecanismo de sanções. Ainda é muito difícil impor uma obrigação. Israel, por exemplo, já foi condenado pela Corte de Haia pela construção do muro (entre seu país e a Cisjordânia) e não deu a menor satisfação”, afirmou Steiner.

Como Israel é signatária de protocolos da ONU que protegem a população civil em áreas de guerra, a diplomacia do Conselho de Segurança está tentando pressionar também por essa via.

“A percepção de que o Conselho de Segurança da ONU é incapaz de agir de forma eficaz pode reduzir o custo percebido de iniciar um conflito para os Estados e outros atores. Em outras palavras, a falta de um mecanismo de dissuasão eficaz pode tornar os conflitos mais prováveis”, avaliou o Secretário do Comitê de Pesquisa da Ásia e do Pacífico da International Political Science Association (IPSA), Alexandre Coelho.

Na teoria, caso Israel descumpra a resolução, poderia ser sancionado por meio de outra resolução do Conselho de Segurança, mas é improvável que isso aconteça por causa do apoio norte-americano.

“O que os EUA poderiam fazer de mais contundente neste momento seria reconhecer o Estado Palestino. Isso seria mais importante do que as sanções e Biden está sendo pressionado para isso. Seria histórico e deixaria Israel sem chão. Mudaria totalmente o rumo da guerra”, afirma Menezes.

Essa opção também é pouco provável. Isso porque Biden está às vésperas de enfrentar as eleições presidenciais nos EUA. “Biden está mais preocupado com sua reeleição e em como manter o seu partido no poder.”

Reações

Até o fim da tarde de quinta-feira (16), Israel e Hamas indicavam que não adotariam a resolução ou partes dela.

-O representante de Israel na ONU criticou o texto e disse: “O Hamas não obedece resoluções”. O governo israelense disse que não haverá pausa antes da libertação dos reféns.
-O Hamas não havia se manifestado sobre o texto.

Outros países, como o Reino Unido, se mostraram otimistas.

“[Esta resolução] salvará vidas. Precisamos de um esforço coletivo para conseguir ajuda o mais rápido possível através de tantas rotas quanto possível”, disse Barbara Woodward, representante permanente do Reino Unido na ONU, após a votação.

A resolução

O que prevê o texto:

-Proteção de crianças na Faixa de Gaza.

-Uma pausa no conflito iniciado em 7 de outubro, que deverá permanecer em vigor por tempo suficiente para que a ajuda humanitária chegue à população civil da Faixa de Gaza. O objetivo é “facilitar o fornecimento contínuo, suficiente e sem entraves de bens e serviços essenciais — incluindo água, eletricidade, combustível, alimentos e suprimentos médicos”.

-Todas as partes envolvidas na guerra devem evitar privar a população do território palestino de serviços básicos e da “assistência humanitária indispensáveis à sua sobrevivência”.

-Liberação dos reféns israelenses tomados pelo Hamas.

-Todas as partes envolvidas na guerra devem evitar privar a população do território palestino de serviços básicos e da “assistência humanitária indispensáveis à sua sobrevivência”.

-Liberação dos reféns israelenses tomados pelo Hamas.

-Reparações de emergência em infraestruturas essenciais, evacuação médica de crianças doentes ou feridas e de seus cuidadores e os esforços de resgate e recuperação de pessoas — inclusive de crianças desaparecidas em edifícios danificados e destruídos.

-Permitir o acesso completo das agências da ONU e de seus parceiros — como o Comitê Internacional da Cruz Vermelha e outras organizações humanitárias imparciais.

Reparações de emergência em infraestruturas essenciais, evacuação médica de crianças doentes ou feridas e de seus cuidadores e os esforços de resgate e recuperação de pessoas — inclusive de crianças desaparecidas em edifícios danificados e destruídos.

Permitir o acesso completo das agências da ONU e de seus parceiros — como o Comitê Internacional da Cruz Vermelha e outras organizações humanitárias imparciais.

A resolução também reafirma que “todas as partes do conflito devem cumprir com suas obrigações” perante as leis internacionais, reiterando que essas regras garantem a proteção total a crianças. O texto não condena Israel nem chama de “atos terroristas” os ataques feitos por Hamas em 7 de outubro.

Foto: Ismail Zanoun.

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