Um policial civil e dono de uma academia de crossfit no Bessa, em João Pessoa, foi denunciado nesta quarta-feira (11) por homofobia, por meio de uma representação cível e criminal enviada ao Ministério Público da Paraíba (MPPB). Conforme o promotor de Justiça João Benjamin Neto, a ação foi enviada pelo Movimento Espírito Lilás (MEL), entidade que atua na defesa dos direitos humanos da população LGBTQIA+. As falas de Eudes foram divulgadas nas redes sociais, tendo como alvo a presença de um casal gay em um comercial de carro.
Ainda conforme o promotor João Benjamin, a representação foi recebida pelo núcleo de gênero, diversidade e igualdade racial (GEDIR/MPPB) e encaminhada aos promotores competentes que vão investigar o caso.
A Secretaria da Mulher e da Diversidade Humana (SMDH) da Paraíba informou ao g1 que também está acompanhando o caso, através da Rede Estadual de combate à LGBTFOBIA (Realp).
O g1 procurou Eudes, que é policial e proprietário da Box10, através das redes sociais e ligando para a academia, para saber se ele queria se posicionar sobre o caso, mas até a ultima atualização dessa matéria, não obteve respostas. A Polícia Civil também foi procurada para se posicionar. As postagens de Eudes não estão mais disponíveis no perfil pessoal dele.
Nas redes sociais, a academia chegou a se pronunciar, dizendo que posicionamentos publicados por qualquer integrante da empresa “representam, exclusivamente, opinião pessoal de quem se manifesta”.
Box 10 se pronuncia sobre postagens homofóbicas feitas pelo dono do estabelecimento, em João Pessoa — Foto: Reprodução/Instagram/Box 10
Vale ressaltar que homofobia não é opinião, é crime conforme decisão de 2019 do Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo a Corte, “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito” em razão da orientação sexual da pessoa pode ser considerado crime, enquadrado na mesma norma do racismo, com pena de prisão, além de multa.
Ainda conforme o promotor de Justiça João Benjamin, “todo o discurso que venha a denegrir, a menosprezar a dignidade da comunidade LGBT pode sim se caracterizar como homofobia e transfobia”.
Nas postagens feitas no perfil de Eudes, ele critica a campanha do novo Polo 2023, da Volkswagen, que tem sido alvo de ataques homofóbicos nas redes sociais por mostrar um casal gay como dono do novo veículo.
Em uma sequência de stories, ele diz que ninguém mais poderia criticá-lo por ter um Fiat 500: “Quinhentinho agora é carro de homem”. Em seguida, ri do amigo que seria dono de um carro Polo.
Após isso, ele compartilha uma sequência de vídeos, onde um homem está na frente de uma concessionária, dizendo que o veículo teria virado “carro dos gays”. Nesse vídeo, Eudes escreveu na legenda: “enquanto mantiver esses doentes militantes à frente das ações de marketing, vão continuar quebrando a cara”.
Logo depois, ele grava um vídeo dele mesmo, chamando de “animal incompetente” quem fez a campanha com o casal homoafetivo.
Ele diz que seria doentio colocar um casal gay em uma propaganda, pois a “maioria” dos consumidores do país seriam conservadores. E, portanto, as empresas não deveriam representar pessoas LGBTQIA+ em meios publicitários por serem uma “minoria”.
Nas legendas do vídeo, diz ainda que colocar um casal homoafetivo em uma peça publicitária traria uma imagem negativa para a empresa.
As postagens viralizaram nas redes sociais e usuários se reuniram para denunciar o perfil de Eudes contra as diretrizes da plataforma, por disseminar discurso de ódio.
O que diz a lei
A LGBTfobia ainda não tem legislação específica no Brasil, mas já era punida antes da decisão de 2019 do STF, visto que a grande maioria das agressões contra a população LGBT+ se enquadram em crimes de injúria, ameaça, difamação e lesão corporal — que são previstos no Código Penal Brasileiro.
Porém, é após a decisão do STF que esses crimes passam a ser punidos com mais rigor. Hoje, a homofobia e a transfobia devem ser criminalizadas e enquadradas no crime de racismo (Lei 7.716/89), de acordo com a corte.
Pode ser criminalizado quem praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito em razão da orientação sexual.
Na decisão, o ministro Celso de Melo considerou que pronunciamentos que “extravasam os limites da livre manifestação de ideias”, transformando-se em insulto, ofensa ou estímulo à intolerância e ao ódio, “não merecem a dignidade da proteção constitucional que assegura a liberdade de expressão do pensamento”.
A pena é de um a três anos de prisão, além de multa. Se houver divulgação ampla de ato homofóbico em meios de comunicação, como publicação em rede social, a pena será de dois a cinco anos de prisão, além de multa.
A aplicação da pena de racismo vale até o Congresso Nacional aprovar uma lei sobre o tema.
Com a mudança, crimes que antes eram tratados como algo de menor potencial ofensivo e acarretavam apenas em um Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) para o agressor, agora podem gerar um flagrante delito ou até uma prisão decretada no decorrer das investigações, a critério da Justiça.
Foto: Eudes P. de Carvalho Neto/Reprodução/Redes sociais