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Últimas famílias da comunidade Dubai deixam ginásios após mais de dois meses da desocupação

Quando a segunda semana de fevereiro começou ainda havia 5 famílias da comunidade Dubai abrigadas em um ginásio de João Pessoa. Nesta segunda-feira (14), as últimas três pessoas saíram do Hermes Taurino, localizado no bairro Mangabeira 7. A saída acontece mais de dois meses depois que cerca de 800 pessoas foram desocupadas da região onde ficava a comunidade.

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Dentre as famílias desocupadas, mais de 600 pessoas tiveram que ser abrigadas em ginásios. De acordo com a Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes) de João Pessoa, essas famílias restantes tiveram dificuldades para se inscrever no auxílio moradia, e por isso não tinham como sair do local. A dificuldade veio do fato de que algumas pessoas não possuíam documentos pessoais.

O processo de mudança das famílias começou ainda em dezembro, com os primeiros moradores conseguindo auxílio moradia na segunda semana do mês. O restante começou a sair dos ginásios a partir do acordo firmado entre a prefeitura e as famílias, que garantia, além do subsídio, que seria construído um conjunto habitacional para todos os moradores. O prazo de entrega do condomínio é dezembro deste ano.

A Sedes informou que, além do auxílio moradia, a partir desta semana, as famílias começam a receber cestas básicas. A Secretaria do Meio Ambiente de João Pessoa está responsável por oferecer uma capacitação de jardinagem para os moradores que tiverem interesse. Por fim, receberão um cartão alimentação entregue pela Secretaria de Desenvolvimento Humano do Governo da Paraíba.

A comunidade Dubai I, localizada na zona sul de João Pessoa, começou a ser desocupada na madrugada do dia 23 de novembro. As construções erguidas no local foram demolidas, e a operação, realizada pela Polícia Militar e pelo Ministério Público, teve início após uma decisão judicial que atendeu ao pedido da prefeitura.

As barracas de lona ficavam em uma área considerada de preservação ambiental, com 15 hectares da mata atlântica remanescente. De acordo com as autoridades envolvidas no caso, como a Secretaria do Meio Ambiente da capital, para construir moradias irregulares as pessoas devastaram grande parte da mata, com a derrubada de árvores e queimadas, cometendo crime ambiental e extinguindo diversas espécies da flora e fauna.

O g1 esteve nos três ginásios para onde as famílias foram levadas logo que aconteceu o processo de desocupação. Muitos moradores alegaram, na época, que a construção da comunidade Dubai I de forma irregular era uma alternativa pautada pelo desespero de não ter outro lugar para morar.

Uma dessas pessoas foi a venezuelana Ana Cecília Bogaví. Na época, a reportagem ouviu da mãe de dois filhos que embora parecesse pouco para muitos, o que ela perdeu na comunidade Dubai eram as chances que nutria, dia e noite, de reconstruir a vida.

Ana Cecília contou que saiu do ginásio no dia 14 de dezembro, antes mesmo do acordo firmado com a prefeitura. — Foto: Ana Beatriz Rocha/g1

Ana Cecília contou que saiu do ginásio no dia 14 de dezembro, antes mesmo do acordo firmado com a prefeitura. — Foto: Ana Beatriz Rocha/g1

Aos 50 anos, era uma das poucas estrangeiras do ginásio Hermes Taurino que tinha tido acesso a documentação. Com isso, já tinha tido acesso a pagar aluguel em João Pessoa, mas conheceu de perto o que significava estar desempregada no Brasil. Nos meses antes da desocupação ela estava fazendo um curso de capacitação para costureira, oportunidade que não conseguiu reconquistar depois que perdeu seu barraco de lona.

Procurada pelo g1 novamente, Ana Cecília contou que saiu do ginásio no dia 14 de dezembro, antes mesmo do acordo firmado com a prefeitura. “Não quis continuar naquela situação de refúgio, como venezuelanos a gente já viveu isso quando entrou na fronteira, a gente não queria ter passado mais uma vez”, desabafou a imigrante.

Foi com essa tristeza que Ana aceitou o auxílio moradia de R$ 350 e partiu em busca de uma nova moradia. Com o recurso só conseguiu alugar uma kitnet em Mangabeira 8, nas proximidades de onde ficava a comunidade Dubai. Lá ela vive com seu filho adulto e outro de 10 anos. Questionada sobre o tempo que passou abrigada no ginásio, a venezuelana conta que não gostaria de ter que lembrar:

“Muito triste ter que passar essa situação, por causa da aglomeração, teve surto de Covid, não tinha privacidade, não podia cozinhar, não tinha banheiro digno, foi tudo muito constrangedor”, contou Ana Cecília.

O auxílio moradia, apesar de suficiente para sair do ginásio, não tem dado para custear as contas e ela segue numa situação de vulnerabilidade. Desempregada, a casa depende dos ‘bicos’ que seu filho mais velho faz em um lava jato, enquanto entrega currículos para tentar um emprego formal há vários meses, sem nenhuma resposta.

Apesar dos desafios de viver com uma renda extremamente limitada num país em que os preços só aumentam, Ana comemora pelo fato de que o filho mais novo vai voltar a frequentar a escola, depois de quase dois anos de afastamento causado pela pandemia.

“Antes da desocupação a gente ainda pegava as tarefas, ele fazia e a gente levava de volta pra escola. Quando a gente ficou no ginásio ele ficou totalmente afastado, mas agora vai voltar”, explica a mãe.

Ana Cecília Bogaví se juntará aos outros ex-moradores da comunidade Dubai no conjunto habitacional garantido pela Prefeitura de João Pessoa no acordo firmado com a população. O prédio, localizado em Gramame, deve ficar pronto ainda este ano. Até lá a venezuelana está apreensiva, mas garante que melhor que quando estava nos ginásios:

“Agora fica a angústia de saber que temos que pagar muitas contas e estamos sem emprego pra comprar o básico. O desassossego de não ter certeza do que vai acontecer, mas é melhor aqui que naquele ginásio”, desabafa.

Criança venezuelana da comunidade Dubai abrigada em ginásio — Foto: Ana Beatriz Rocha/g1

Criança venezuelana da comunidade Dubai abrigada em ginásio — Foto: Ana Beatriz Rocha/g1

Ainda em dezembro os venezuelanos foram transferidos do ginásio Hermes Taurino para o Afonso Pereira, também em Mangabeira. A decisão seguiu uma recomendação do Ministério Público da Paraíba, que acreditava que era importante manter os moradores unidos para que pudessem manter seus hábitos culturais e alimentares.

O primeiro local esvaziado, de acordo com a Sedes, foi o Centro Profissionalizante Deputado Antônio Cabral (CPDac), em Valentina. Lá era, também, o local com maior número de moradores abrigados. A secretaria informou, ainda, que durante a estadia dos moradores não houve grandes conflitos nem problemas mais graves, e que as equipes de Direitos Humanos estiveram sempre presentes para mediar as discussões das partes interessadas.

Foto: Luana Almeida/g1

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