A Câmara aprovou nesta terça-feira (16) projetos que têm o objetivo de ampliar os direitos e a proteção às mulheres. Um deles trata de punição a quem constranger vítimas e testemunhas de crimes durante audiências e julgamentos.
Os projetos aprovados seguem agora para análise do Senado.
A proposta que trata de punição a constrangimento de vítimas foi apresentado em novembro de 2020 após a repercussão nacional do caso da blogueira Mariana Ferrer, de Santa Catarina. O projeto visa a coibir especialmente a prática de atos que ofendam vítimas de crimes contra a dignidade sexual.
A jovem acusa o empresário André de Camargo Aranha de tê-la estuprado em dezembro de 2018. Durante uma audiência no processo, o advogado de defesa, Cláudio Gastão da Rosa Filho, exibiu fotos de Mariana Ferrer dizendo que eram imagens “ginecológicas” e afirmou que “jamais teria uma filha” do “nível” da blogueira.
Em outro momento, Cláudio Gastão disse que o choro de Mariana era “falso” e que ela tinha “lábia de crocodilo”.
O advogado sustentou, durante o processo, a tese de que seu cliente não tinha como saber que Mariana não estava em condições de consentir a relação sexual que teve com André Aranha. Por isso, segundo a tese da defesa, o empresário não teve a intenção (dolo) de cometer o estupro. Ao fim do processo, André Aranha foi absolvido.
O projeto
A proposta diz que, nas audiências e no julgamento – em especial quando são apurados crimes contra a dignidade sexual – promotores, advogados, juízes e demais participantes deverão “zelar pela integridade física e psicológica da vítima”. Caso contrário, poderão responder civil, penal e administrativamente.
O texto, que altera o Código de Processo Penal e a lei sobre juizados, diz que, nessas audiências e no julgamento, está proibida:
a manifestação sobre fatos que não estejam no processo;
a utilização de linguagem, informações ou material que ofendam a dignidade da vítima ou de testemunhas.
O projeto também altera o Código Penal, no capítulo sobre crimes contra a administração da Justiça, para aumentar a pena para o crime de coação no curso de processo – que é quando uma pessoa usa de violência ou grave ameaça durante um processo judicial.
A pena para essa prática hoje é de um a quatro anos de reclusão. Se a proposta virar lei, a punição será maior caso a coação ocorra em processo sobre crime contra a dignidade sexual.
O texto segue, agora, para o Senado. Defensores do projeto lembraram o caso Mariana Ferrer.
“A vítima foi publicamente insultada e humilhada pela acusação diante do inaceitável silêncio do representante do Ministério Público e do juiz”, disse a relatora do projeto, deputada Alice Portugal (PCdoB-BA).
“Está claro para todos a necessidade de se modificar o Código de Processo Penal brasileiro, para estabelecer a vedação do uso de linguagem, material ou informações que se refiram à vida íntima das partes ou testemunhas, com o propósito de constranger, discriminar ou humilhar pessoas, especialmente a mulher, durante quaisquer atos de natureza processual”, acrescentou a parlamentar baiana.
Exames pré-Natal
Alguns projetos aprovados nesta quinta já estavam na pauta da semana retrasada, quando foi celebrado o Dia Internacional da Mulher. Porém, como na última semana os deputados precisaram de três sessões deliberativas para concluírem a análise da proposta de emenda à Constituição (PEC) Emergencial, a votação das matérias sobre as mulheres só pôde ocorrer agora.
Outro projeto aprovado pelos deputados prorroga o prazo de validade de prescrições médicas para realização de exames no período pré-natal e de puerpério durante a pandemia do novo coronavírus.
Pela proposta, os pedidos podem ser feitos digitalmente e valem enquanto durarem as medidas de isolamento e contenção da doença.
Segundo a relatora da matéria, deputada Liziane Bayer (PSB-RS), a proposta tem como objetivo preservar a saúde das gestantes e reduzir os riscos de exposição ao coronavírus.
“As gestantes seriam expostas a riscos de contaminação ao ir à procura dos médicos que realizam o acompanhamento pré-natal, caso os pedidos de exames não pudessem ser aceitos pelos serviços de diagnóstico complementar diante da expiração do prazo de sua validade”, diz o relatório.
Pelo texto aprovado, os prazos de validade de prescrições médicas e pedidos para realização de exames diagnósticos para o adequado acompanhamento da saúde, no período do pré-natal e puerperal, serão válidos durante todo o período em que se estender a gravidez e puerpério em que foi realizado o pedido.
De acordo com o projeto , as gestantes e mulheres em puerpério devem ter acesso facilitado a cuidados intensivos e à internação em leitos de UTI, enquanto durarem as medidas de isolamento para combater a pandemia do novo coronavírus.
Formulário de avaliação de risco
Segundo o G1, a Câmara também aprovou um projeto de lei que cria o Formulário Nacional de Avaliação de Risco. O documento, que deve ser aplicado a vítimas de violência doméstica e familiar, tem como objetivo identificar fatores de risco à mulher.
Os dados, que serão mantidos sob sigilo, devem servir de base para a atuação de órgãos de segurança pública, do Ministério Público, do Poder Judiciário e de entidades da rede de proteção.
Pelo texto, o formulário deve ser preenchido preferencialmente durante o registro de ocorrência na polícia civil. Se não for possível, a aplicação deve ser feita pela equipe do Ministério Público ou do Judiciário durante o primeiro atendimento da vítima.
Apelidado de “Frida”, em referência à pintora mexicana Frida Kahlo, o formulário foi uma iniciativa conjunta do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), formulada com base em estudo de peritos brasileiros e europeus.
Inicialmente, a proposta, de autoria da deputada Elcione Barbalho (MDB-PA), era incluir a criação do formulário na Lei Maria da Penha. Porém, a relatora, Rosa Neide (PT-MT), preferiu criar uma lei autônoma em função de seu simbolismo.
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