O Instituto Butantan, que tem parceria com o laboratório chinês Sinovac para a produção da CoronaVac, afirma que aguarda há mais de um mês a liberação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para importar insumos da vacina. O Butantan afirma em nota que “espera que a Anvisa reavalie prazos e contribua para resguardar a saúde pública e a proteção dos brasileiros”.
O instituto solicitou, no dia 18 de setembro, uma autorização excepcional para a importação imediata de matéria-prima para produção da CoronaVac no Brasil. No entanto, a agência ainda não liberou a importação.
O Butantan afirma que a agência “só deve deliberar sobre o tema daqui a três semanas, impactando as perspectivas de produção e disponibilização de vacina para a população brasileira”. Apesar disso, a Anvisa diz que a votação deve apresentar decisão “em no máximo 5 dias úteis”.
Nesta quarta-feira (21) o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), e o diretor do Butantan, Dimas Covas, tiveram reunião com o presidente da Anvisa e outros diretores da agência. Após a reunião, Doria publicou nas redes sociais que, depois do encontro, saíram “ainda mais confiantes e esperançosos com a capacidade técnica e científica da Agência Nacional de Vigilância Sanitária”.
Em entrevista à TV Globo, Dimas Covas afirmou que pode ocorrer um atraso de até 15 dias no cronograma do governo estadual, e que as vacinas podem não “estar prontas exatamente em dezembro, como havia anunciado, mas em começo ou meados de janeiro”. “Normalmente esse tipo de pedido tramita muito rapidamente em dez dias. Nós obtivemos uma resposta no dia de hoje solicitando informações adicionais, portanto já quase 30 dias após o pedido inicial e uma previsão de que o assunto será deliberado agora no início de novembro”, disse Dimas Covas nesta quinta.
A Anvisa, segundo a lei, deve ser independente e ter autonomia com relação ao Poder Executivo federal. A agência é responsável pelos registros de medicamentos e vacinas em todo o Brasil. E
m nota, a Anvisa afirma que “devido ao período de transição da composição da diretoria colegiada da Agência, a decisão sobre o pedido de importação foi colocada em Circuito Deliberativo” e que este tipo de votação deve apresentar decisão “em no máximo 5 dias úteis”.
“Desta forma, a decisão não depende da realização de reunião presencial de Diretoria Colegiada. Ainda que o pedido de importação seja autorizado, a vacina não pode ser aplicada na população, tendo em vista que a Coronavac não possui registro sanitário no Brasil. A Anvisa reafirma o compromisso de trabalhar de forma técnica e com a missão de proteger a saúde da população brasileira”, completa a nota.
Também em nota, o Butantan afirma que o pedido “tem caráter excepcional para agilizar o fornecimento do imunizante no Brasil, contribuindo para salvar vidas e combater a pandemia” e que “obviamente, a vacina não será aplicada sem aprovação e registro da Anvisa, que serão requeridos ao fim dos estudos clínicos de segurança e eficácia da vacina”.
A Associação dos Servidores da Anvisa (Univisa) publicou nota nesta quinta-feira dizendo que, “independentemente de origem ou nacionalidade, os produtos serão avaliados dentro dos mais elevados padrões técnicos e científicos, com a finalidade de promover o acesso e proteger a saúde do povo brasileiro”.
Desistência do governo federal
Também nesta quinta, o secretário da Saúde do estado de São Paulo, Jean Gorinchteyn, disse que ainda não foi comunicado oficialmente pelo Ministério da Saúde sobre a suspensão da compra de cerca de 46 milhões de doses da CoronaVac. Segundo ele, o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, disse-lhe ao telefone “que o governo federal desistiria apenas da compra de 6 milhões de doses e que só ficou sabendo da desistência de todo o acordo pela imprensa. ”
“Oficialmente nós não recebemos uma outra normativa, uma outra visão que pudesse suscitar a impressão que as tratativas tidas até hoje possam ter sido modificadas”, disse o secretário em entrevista nesta quinta.
Na última terça-feira (20), durante uma reunião em que estavam presentes 24 governadores, Pazuello anunciou a intenção de compra de 46 milhões de doses da CoronaVac e a inclusão da vacina no Plano Nacional de Imunização (PNI).
Destas, 6 milhões viriam prontas da China, e o restante receberia matéria-prima chinesa, mas seria envasado no Instituto Butantan. Com isso, o governo federal deveria editar uma nova Medida Provisória para disponibilizar R$ 2,6 bilhões até janeiro. O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), assinou em 30 de setembro um contrato com o laboratório chinês Sinovac para o recebimento dessas 46 milhões de doses da vacina.
No entanto, na quarta (21), o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) desmentiu o ministro em comentários nas redes sociais. Mais tarde, ele disse a jornalistas que “já mandou cancelar” o protocolo de intenção de compra das doses anunciadas por Pazuello.
Nesta quinta, o secretário da Saúde de SP voltou a dizer que o aporte do governo federal é necessário pra que o Instituto Butantan possa produzir a CoronaVac em larga escala.
O secretário afirmou à TV Globo que a importação das 6 milhões de doses e o envase das outras 40 milhões estão mantidos e que o Butantan vai atrás de outros parceiros.
Em nota enviada à imprensa na quarta-feira (21), a Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo afirmou que esperava que o ministério honrasse com “compromisso que assumiu publicamente” para negociação de compra da CoronaVac.
A secretaria citou uma carta oficial de segunda-feira (19), em que o Ministério manifestou a intenção da compra, além da fala do próprio ministro durante a reunião com os governadores na terça, em que afirmou que “A vacina do Butantan será a vacina brasileira”.
Após a repercussão da desautorização do ministro por Bolsonaro, Pazuello afirmou em uma transmissão ao vivo ao lado do presidente nesta quinta-feira que “é simples assim: um manda e o outro obedece”.
6 milhões de doses
O secretário da Saúde do estado afirmou que o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, disse na manhã desta quarta-feira (21) que o governo federal cancelaria o investimento de apenas 6 milhões das 46 milhões de doses da CoronaVac prometidas.
De acordo com Gorinchteyn, a conversa ocorreu por telefone às 9h, de forma amistosa, e durou cerca de dez minutos, pouco antes de o presidente Jair Bolsonaro anunciar que não iria adquirir a CoronaVac, vacina contra o coronavírus desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac em parceria com o Instituto Butantan.
Segundo Gorinchteyn, Pazuello disse que estava sabendo da intenção de Bolsonaro, mas explicou que a negativa de aquisição só se aplicaria às seis milhões de doses que já viriam prontas da China.
“O que deu a entender é que os seis milhões de doses da vacina do Butantan que viriam da China, esses não seriam adquiridos, apenas os 40 milhões. Isso é o que deu para entender. Mas queremos entender melhor essas tratativas”, afirmou. Gorinchteyn disse que o governo de São Paulo “recebeu com imenso espanto” o posicionamento do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e do Ministério da Saúde de não adquirir a CoronaVac.
“Recebemos com imenso espanto. A vacina é um direito da população, e é a única maneira que temos de evitar que tantas pessoas continuem morrendo. O governo do estado de São Paulo irá, assim que aprovado pela Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária], fornecer aos brasileiros a vacina”, afirmou Gorinchteyn em entrevista ao G1.
Após a postagem de Bolsonaro, o secretário-executivo do Ministério da Saúde, Élcio Franco, negou, durante um pronunciamento, a intenção do governo federal de adquirir o imunizante.
“Não houve qualquer compromisso com o governo do estado de São Paulo ou seu governador no sentido de aquisição de vacinas contra Covid-19”, disse Franco. “Tratou-se de um protocolo de intenção entre o Ministério da Saúde e o Instituto Butantan, sem caráter vinculante. Não há intenção de compra de vacinas chinesas”, acrescentou o secretário.
Ainda de acordo com Gorinchteyn, o governo paulista foi “pego de surpresa” com a mudança de discurso em menos de 24 horas.
“Fomos pegos de surpresa por uma coisa que estava muito certa, pela fala do ministro, pelas colocações de todos os secretários, do Ministério. Isso fez com que todos ali parabenizassem o ministro pela condução, todos os governadores, os secretários, os representantes do Conass [Conselho de secretários de Saúde]. Ficou claro que estava tudo muito bem. Então, foi uma vitória do Brasil naquele momento”, comentou o secretário de Saúde de SP.
Questionado sobre se a posição do governo federal pode atrapalhar o processo de aprovação da CoronaVac na Anvisa, o secretário disse confiar que não. “A Anvisa é um órgão muito técnico e ético. Sempre se pautou nesses pilares. Então não tenho dúvida que não teremos nenhum impasse nesse sentido”.
Nas postagens, o presidente também escreveu que, antes de ser disponibilizada à população, a imunização deve ser “comprovada cientificamente pelo Ministério da Saúde e certificada pela Anvisa”.
Mas, ao anunciar o acordo na terça-feira, o próprio Ministério da Saúde informou que, para que a imunização tenha início, as vacinas – tanto a da Sinovac como a de Oxford, que já teve intenção de compra anunciada pelo governo federal – “devem ser liberadas pela Anvisa e ter eficácia e segurança garantidas”.
Assim como as demais vacinas testadas no Brasil, a CoronaVac está em fase de testes e sua eficácia ainda precisa ser comprovada antes que o uso seja liberado pela Anvisa. Nos testes, são aplicadas duas doses do imunizante por voluntário.
Reuniões com os estados
O anúncio de que o Ministério da Saúde compraria 46 milhões de doses da CoronaVac veio após uma reunião em que participaram 24 governadores, incluindo o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), e o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello.
Após o encontro, o ministro Pazuello disse que quando a vacina fosse aprovada, as doses seriam distribuídas a todo o Brasil por meio do Programa Nacional de Imunizações (PNI), que há décadas é responsável por campanhas nacionais de vacinação.
“O Butantan já é o grande fabricante de vacinas para o Ministério da Saúde, para o SUS. 75% das vacinas que nós compramos para vacinar os brasileiros vêm do Butantan. Então, a vacina do Butantan será a vacina brasileira”, disse Pazuello.
Ministério da Saúde chegou a afirmar que “somadas, as três vacinas – AstraZeneca, Covax e Butantan-Sinovac – representam 186 milhões de doses, a serem disponibilizadas ainda no primeiro semestre de 2021”.
Segundo auxiliares do presidente, Bolsonaro desautorizou Pazuello. Ao blog da Andréia Sadi, fontes do Planalto disseram acreditar que o governo não vai recuar da compra, desde que duas condições sejam atendidas: que a vacina seja aprovada Anvisa e que a vacinação não seja obrigatória.
Antes do encontro da terça-feira (20), outra reunião havia sido realizada com os secretários estaduais de Saúde, em que o governo federal não havia incluído a CoronaVac no programa nacional de vacinação.
Em entrevista ao G1, o secretário estadual da Saúde de São Paulo, Jean Gorinchteyn, disse, na ocasião, que o ministério só havia investido em Oxford, e tratava vacinas que estavam na mesma fase de testes de “maneira diferente”.
Contrato com SP
O governo de São Paulo já havia fechado contrato com o laboratório chinês para a aquisição dessas 46 milhões de doses. A gestão João Doria (PSDB) buscava negociar com o governo federal para que elas fossem distribuídas via Sistema Único de Saúde (SUS).
Apesar disso, o governador já chegou a afirmar que, caso não houvesse acordo com o Ministério da Saúde, o governo estadual iria garantir a vacinação para “os brasileiros de São Paulo”.
O acordo para compra de 46 milhões de doses foi firmado com verba estadual e custou 90 milhões de dólares. A assinatura foi feita por Doria durante coletiva de imprensa no final de setembro. Segundo Dimas Covas, diretor do instituto Butantan, a vacina começaria a ser envasada no Brasil já em setembro.
O governo estadual também anunciou a previsão de adquirir mais 15 milhões de doses até fevereiro de 2021, chegando ao total de 61 milhões com verba própria. A expectativa era que, com o dinheiro do governo federal, mais 40 milhões fossem adquiridas, chegando a 100 milhões até maio de 2021.
No entanto, o acordo que havia sido anunciado na terça com o governo federal não contemplava as 55 milhões de doses adicionais que o governo do estado de SP anunciou até maio de 2021, apenas as 46 milhões de doses que já estavam garantidas em contrato com a empresa chinesa.
Segurança da vacina
A CoronaVac está na terceira fase de testes. Nesta segunda-feira (20), o governo de São Paulo afirmou que 35% dos nove mil voluntários que participam dos testes no Brasil apresentaram reações adversas leves. Segundo o governo, não houve registro de efeitos colaterais graves e, por isso, a vacina pode ser considerada segura.
A informação faz parte de um estudo parcialmente apresentado em entrevista coletiva. O estudo, no entanto, não foi publicado em revista científica. Ainda não há dados sobre a eficácia da CoronaVac. Segundo o governo, essas informações serão apresentadas até o fim do ano.
Embora Doria tenha garantido anteriormente que a vacina começaria a ser aplicada em profissionais de saúde no dia 15 de dezembro, o diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, disse nesta segunda que a data para liberação ainda é incerta. Para ser aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), é necessário que a eficácia da vacina também seja comprovada.
“As perspectivas da vacina são otimistas, mas não podemos dar uma data específica de quando isso vai acontecer. Esperamos que até o final do ano essa vacina tenha o dossiê entregue na Anvisa, e que a Anvisa possa proceder a análise e o registro”, disse.
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