O número de bolinhas cor-de-rosa no topo da tela do Instagram parece aumentar exponencialmente a cada dia, corroborando os recordes de audiência registrados nas principais redes sociais desde o começo da pandemia do novo coronavírus. Os “pushes” (aquelas notificações na “janelinha” retrátil da tela do celular) de noves lives são quase tão abundantes quantos as notícias – ora boas, ora ruins – sobre o avanço da Covid-19 no mundo. O debate sobre o potencial ansiogênico e viciante das redes não é de hoje mas, como quase todos os aspectos do cotidiano, ganhou novas cores nestes tempos de isolamento. Se, por um lado, estas aplicativos tão familiares possibilitam o estreitamento de laços com quem está longe, o acesso a informações relevantes e, claro, o entretenimento necessário à manutenção do bom humor, por outro, os efeitos colaterais do consumo exacerbado do festival de vidas alheias, amplamente conhecidos e alardeados por especialistas em saúde mental, continuam aí e encontram, no crescente tempo tela, o princípio de uma tempestade perfeita.

Segundo a Veja, diante deste cenário, definir quais são os amigos, os influenciadores, as páginas e, claro, as lives que farão parte deste novo cotidiano já repleto de limites e preocupações é tarefa urgente. Muito antes da pandemia amplificar o papel das redes como janela para o mundo exterior, a busca por um ambiente virtual mais saudável foi o que levou a jornalista Dani Arrais e a publicitária Luiza Voll a criarem a campanha #ainternetqueagentequer, promovida pelo estúdio de criação Contente. Além de promover palestras e workshops sobre vida digital, o grupo divulga dicas de como extrair o melhor do ambiente virtual em uma página que conta com mais de 50 000 seguidores. “Do mesmo jeito que o número de pessoas faxinando cada cômodo das suas casas parece ter aumentado muito, talvez seja bom aproveitar esse tempo para faxinar as redes sociais também”, defende a dupla.

Que atire a primeira pedra, afinal, quem nunca torrou horas preciosas “stalkeando” o perfil de um ex-namorado ou se ressentindo por não conseguir fazer, no próximo verão, a viagem dos sonhos para as Maldivas vendida pela influenciadora favorita? “Quem aí não tem seus guilty pleasures? Por mais que façamos uma curadoria, não dá para ser tudo tão controlado assim. Mas vale observar quanto tempo você passa ‘amando odiar’ seguir determinadas pessoas”, defende Dani. Outro ponto importante é deixar de lado a “FOMO” (“fear of missing out”, em tradução livre, o medo de perder alguma coisa), tão comum diante da abundância de transmissões ao vivo, cursos, livros e dicas a perder de vista. “O segredo é entender o que você quer desse momento. Eu, Dani, só tenho visto lives de música. Ainda não estou com vontade de ‘aproveitar o tempo’ para aprender algo”, defende a criadora.

Para quem alimenta o ambiente digital (e, principalmente, vive dessa produção), uma dica de ouro: “pega mal se mostrar desconectado do que está acontecendo no mundo, fazendo publicidade como se tudo estivesse normal. Spoiler: não está”, diz a dupla. Os novos tempos, afinal, demandam novos comportamentos – que não são adotados em massa. “Parece que vale tudo para aumentar o número de seguidores, de visualizações, não é? Se por um lado o mercado digital pode amadurecer nesse período, também pode ser possível que tudo continue igual. A resposta passa por uma investigação rigorosa dos próprios hábitos. Você quer falar só porque todos estão falando ou realmente tem algo a dizer?”, lembra. Ainda que seja cedo para avaliar o resultado da transformação, o esperado é que, de bolinha em bolinha, a internet se transforme em um ambiente mais saudável, como resultado, principalmente, da demanda da clientela. Veja, abaixo, algumas dicas para começar a “limpa” nas redes:

Urgência de mudança: se uma página leva o usuário a sentir que precisa mudar muitas coisas em si mesmo (sua aparência, como se comporta ou o que gosta) talvez seja hora de rever a relação com o conteúdo em questão e avaliar a natureza do desejo de transformação. Vale questionar se a mudança é necessária, possível e condizente com os próprios objetivos, ou se é uma demanda fomentada pelo perfil e que, na prática, não tem nada a ver com o consumidor.

Muito além da “invejinha”: sentir inveja, frustração ou até mesmo raiva pode ser comum. Mas se algum perfil produz esses sentimentos constantemente, talvez seja a hora de deixá-los para trás. Um bom teste é perguntar a si mesmo o que tanto incomoda naquela pessoa. É porque ela posta muito e talvez você quisesse postar mais? Ou é um desejo nocivo, que dificilmente será sanado e não vai levar a lugar algum?

Fora do mundo: se há a impressão de que o perfil transmite uma visão muito descolada do mundo real, fazendo-o sentir constantemente pessimista ou completamente alienado aos problemas da vida, talvez seja o momento de procurar páginas que mostrem os dois lados da moeda ou equilibrar o conteúdo a ser acompanhado. Não se trata de eliminar todas as páginas de bichinhos fofos ou depoimentos trágicos, mas de transformar a rede em ambiente capaz de traduzir a realidade.

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