O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski determinou nesta quinta-feira, 28, sigilo sobre a ação em que a defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva conseguiu acesso às mensagens da força-tarefa da Operação Lava Jato vazadas por hackers, alvo da Operação Spoofing. Segundo o STF, o sigilo foi decretado a pedido dos advogados do petista “por haver nos autos material que a defesa considerou ser sigiloso”.
Nesta quarta-feira, 27, antes de o ministro determinar o sigilo, a defesa de Lula havia incluído na ação uma petição em que os próprios advogados divulgam algumas mensagens já analisadas por um perito judicial. Segundo a defesa, o profissional analisou preliminarmente cerca de 10% dos 740 gigabytes de dados fornecidos de mensagens apreendidas com o hacker Walter Delgatti Neto. Na decisão em que havia determinado à Justiça Federal que fornecesse as mensagens aos defensores do petista, em dezembro, Lewandowski havia determinado que o conteúdo ficasse “sob rigoroso sigilo”.
VEJA teve acesso com exclusividade ao conteúdo apresentado ao STF pela defesa como sua “análise preliminar”, encaminhado aos advogados na quarta-feira pelo perito Cláudio Wagner, que mostra sete diálogos curtos entre o ex-juiz federal Sergio Moro e o ex-coordenador da força-tarefa da Lava Jato no Paraná, Deltan Dellagnol.
O conteúdo mostra Moro questionando o procurador da Lava Jato sobre uma denúncia contra Lula, orientando-o sobre o aproveitamento de provas e pedindo para ser “informado” sobre os desdobramentos de apurações. Deltan chega a sugerir ao então magistrado como conduzir a oitiva de um investigado e atende com rapidez um pedido de Moro para protocolar uma manifestação em uma ação, além de citar a ele reuniões com “suíços” e “americanos”.
Para os advogados de Lula, “é possível desde já constatar, para além da escancarada ausência de equidistância que deveria haver entre juiz e partes, por exemplo: (i) a efetiva existência de troca de correspondência entre a “Força Tarefa da Lava Jato” e outros países que participaram, direta ou indiretamente, do Acordo de Leniência da Odebrecht, como, por exemplo, autoridades dos Estados Unidos da América e da Suíça; (ii) documentos e informações que configuram quebra da cadeia de custódia relacionados aos sistemas da Odebrecht; e (iii) a busca selvagem e a lavagem de provas pelos órgãos de persecução, com a ciência e anuência do juízo de piso”.
Veja abaixo mensagens apresentadas pela defesa de Lula ao Supremo:
Cobrança de Moro por denúncia
Em uma das mensagens, trocadas em 23 de fevereiro de 2016 e incluídas pela defesa de Lula na ação, Moro pergunta se os procuradores têm uma “denúncia sólida o suficiente”. Em seguida, Deltan Dallagnol informa a ele linhas gerais do que os procuradores pretendiam apresentar contra Lula (clique para ampliar):
Reunião sigilosa com suíços
Em mensagens trocadas entre 28 de novembro e 1º de dezembro de 2015, Deltan e Moro tratam de investigações da Lava Jato sobre contas no exterior. O procurador chega a citar uma reunião com “os suíços, que vêm pra cá pedindo extremo sigilo quanto à visita”. Em mensagens seguintes, diante de informações de Deltan sobre contas da Odebrecht no exterior, o então juiz pergunta se o beneficiário dos repasses delas seria “JS”, referência ao marqueteiro João Santana, responsável por campanhas presidenciais do PT, preso em fevereiro de 2016. O procurador responde que sim e informa o nome de uma conta no exterior usada por Santana para receber pagamentos da empreiteira, a “shellbill”:
Cautela com Léo Pinheiro
Deltan pede a Moro que limite o depoimento do empreiteiro Léo Pinheiro, da OAS, aos fatos pelos quais ele era acusado em uma ação penal, não permitindo que ele ampliasse os relatos em busca de benefícios penais sem ser delator.
Celulares, suíços e americanos
Em 18 de outubro de 2016, um dia antes da prisão do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, Deltan Dallagnol tentava combinar um horário para encontrar Sergio Moro e falar com ele “sobre apreensão dos celulares”. Ele também cita reuniões com representantes suíços e americanos para “discutir e negociar percentuais da divisão do dinheiro”
“Respirar fundo” por causa de Lula
Em 29 de agosto de 2017, dois dias depois de o jornal Folha de S. Paulo publicar uma reportagem em que o advogado Rodrigo Tacla Durán, acusado de ser operador de propinas da Odebrecht, acusava um amigo de Moro de intermediar acordos de delação premiada, o procurador e o juiz conversaram sobre o assunto. Diante da reportagem, e de outras publicadas pelo mesmo jornal, Lula havia pedido a oitiva de Tacla Durán no processo em que é réu acusado de receber propina da Odebrecht por meio de um terreno que abrigaria o Instituto Lula e de uma cobertura vizinha à dele em São Bernardo do Campo. O pedido do petista foi apresentado às 15h17 e acabou negado por Moro às 16h48 no mesmo dia em que as mensagens foram trocadas.
Moro orienta Deltan sobre sistemas da Odebrecht
Em agosto de 2017, o então juiz diz que seriam necessárias perícias da PF e laudos específicos: “do contrário, vai ser difícil usar”.
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