O programa de vacinação contra a covid-19 em Israel tem sido reconhecido como o mais eficiente do mundo, com taxas de imunização (em relação ao tamanho da população) incomparáveis mesmo nos países mais desenvolvidos.
Mas enquanto 28% da população havia sido vacinada até segunda-feira (25/01), quase 5 milhões de palestinos nos territórios ocupados e na Faixa de Gaza permaneciam excluídos.
Nos EUA, diversos parlamentares democratas nos Estados Unidos se uniram às críticas e apelos de várias organizações para que Israel forneça às autoridades palestinas vacinas suficientes para proteger sua população, conforme exigido pelas convenções internacionais em casos de ocupações.
O ministro da Saúde de Israel, Yuli Edelstein, disse à BBC que, em relação ao programa de vacinação, sua primeira responsabilidade era para com os cidadãos de Israel.
Embora reconheça que Israel tem “interesse” em vacinar os palestinos nos territórios ocupados, ele diz não ter uma “obrigação legal” de fazê-lo.
Alguns críticos classificaram essa política como um “apartheid”, enquanto outros a destacaram como mais uma prova da necessidade de acabar com a ocupação.
Êxito impressionante
Segundo o Exame, a implementação do programa de vacinação contra a covid-19 em Israel tem sido elogiada. Trata-se de um país relativamente pequeno – tanto em território quanto em população -, com um sistema nacional de saúde digitalizado e que conta com a ajuda de um extenso exército para distribuir e administrar o vacina.
Israel também se beneficiou, entre outros motivos, de um pacto com a Pfizer para receber grandes quantidades de sua vacina em troca de compartilhamento de informações sobre os efeitos e reações com a gigante farmacêutica.
Mas em 14 de janeiro, o Escritório do Alto Comissariado para os Direitos Humanos (OHCHR) advertiu que “Israel não garantiu que os palestinos sob ocupação na Cisjordânia e Gaza terão acesso às vacinas disponíveis no futuro próximo”.
Israel incluiu em seu programa de vacinação seus cidadãos árabes e palestinos que vivem em Jerusalém Oriental, mas os outros quase 5 milhões de palestinos permanecerão desprotegidos e expostos ao coronavírus, enquanto os israelenses que vivem perto ou entre eles – incluindo colonos nos assentamentos – serão vacinados.
“Moral e legalmente, esse acesso diferenciado aos cuidados de saúde necessários em meio à pior crise global de saúde em um século é inaceitável”, apontou a agência de direitos humanos.
No entanto, em entrevista ao programa Andrew Marr, da BBC, o ministro Edelstein afirmou que os Acordos de Oslo “dizem claramente que os palestinos devem cuidar de sua própria saúde”.
“Não somos legalmente obrigados”
Esse argumento sugere que um componente-chave dos Acordos de Oslo – princípios de paz assinados entre israelenses e palestinos em 1993 e que estão atualmente suspensos – determina que a Autoridade Palestina assumiria a responsabilidade pelos cuidados de saúde de seu povo, incluindo a vacinação.
De acordo com o OHCHR, a pandemia causou estragos nos territórios ocupados nos últimos meses e pressionou ainda mais o já destruído sistema de saúde palestino, enquanto Gaza passa por uma lamentável deterioração em termos de saúde após um bloqueio que já dura 13 anos.
A ONU exortou Israel a cumprir o Artigo 56 da Quarta Convenção de Genebra, que exige que uma potência ocupante deve “até o máximo de seus meios” manter os serviços de saúde nos territórios ocupados e aplicar “as medidas profiláticas e medidas preventivas necessárias para combater a propagação de doenças contagiosas e epidemias”.
Mas o ministro Edelstein defendeu sua posição à BBC. “Se é responsabilidade do Ministério da Saúde de Israel cuidar dos palestinos, o que exatamente é responsabilidade do Ministro da Saúde da Palestina, cuidar dos golfinhos no Mediterrâneo?”.
Edelstein afirmou que “quando se trata de vacinação, a principal obrigação de Israel é com seus cidadãos”. “Eles pagam impostos por isso, não é?”
No entanto, ele acrescentou que a vacinação dos palestinos é para Israel um assunto de interesse nacional.
“Não é nossa obrigação legal, mas é nosso interesse garantir que os palestinos tenham a vacina, para que não tenhamos a propagação da covid-19.”
Especialistas ligados à ONU rejeitam, porém, o argumento do ministro, afirmando que a lei internacional – como a Convenção de Genebra – se sobrepõe a acordos como o de Oslo.
Crítica de representantes democratas
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 160 mil palestinos nos territórios ocupados testaram positivo para coronavírus desde março de 2020, com mais de 1.700 mortes relacionadas ao covid-19.
Além disso, as infecções e as mortes aumentaram nas últimas semanas.
Especialistas da ONU dizem que a Autoridade Palestina encomendou vacinas por conta própria, mas pode levar várias semanas para que elas cheguem à Cisjordânia e à Faixa de Gaza.
Organizações humanitárias, incluindo a Human Rights Watch e a Anistia Internacional, apelaram a Israel para expandir seu programa de vacinação à população palestiniana nos territórios ocupados.
De modo mais amplo, a OMS também alertou para um “apartheid” na vacinação de devido à distribuição desigual da imunização entre países ricos e pobres.
Nos EUA, importante aliado de Israel, vários legisladores se uniram na condenação da política de imunização israelense. A representante democrata na Câmara dos Deputados Rashida Tlaib, de origem palestina, acusou diretamente o governo israelense de buscar políticas segregacionistas.
“É difícil assistir enquanto esse Estado de apartheid continua a negar (a vacina) a seus vizinhos, as pessoas que respiram o mesmo ar que eles, que vivem nas mesmas comunidades”, declarou.
O também deputado democrata Jamaal Bowman declarou que “essa crueldade é outro lembrete de por que a ocupação deve acabar”.
A recém-eleita representante Maire Newman escreveu no Twitter em um tom mais moderado que “o vírus não discrimina nacionalidade, fronteira ou religião” e que o governo de Israel “tem obrigação moral e humanitária de que israelenses e palestinos tenham acesso às vacinas”.
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