O presidente Jair Bolsonaro adotou postura de cautela e interrompeu as negociações para a realização de uma reforma ministerial no início deste ano.
A articulação com os partidos do centrão, que vinha ocorrendo desde o ano passado, foi paralisada após o deputado federal Baleia Rossi (MDB-SP) ter efetivado nesta segunda-feira (4) alianças com siglas de oposição na disputa pela presidência da Câmara.
A bancada do PT anunciou, após reunião por videoconferência, que apoiará o candidato do presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ). A legenda tem a maior bancada, com 52 parlamentares.
O avanço do bloco de Maia convenceu Bolsonaro a seguir conselho de assessores palacianos, sobretudo da cúpula militar, de interromper negociações até que o cenário de favoritismo se torne mais claro, o que esperam que ocorra até o final de janeiro.
Além do PT, PDT, PSB, PC do B e Rede oficializaram a entrada na candidatura de Baleia. O receio no governo é de que o movimento possa mudar a posição de legendas como Solidariedade e PTB, que já tinham sinalizado apoio ao deputado federal Arthur Lira (PP-AL), líder do centrão e nome de Bolsonaro.
O diagnóstico no Palácio do Planalto é de que agora há chances concretas de uma vitória de Baleia. Caso ela ocorra, o mapa de cargos articulado até o momento terá de ser refeito, já que Bolsonaro será obrigado a negociar espaço com o MDB para garantir a votação da pauta de interesse do governo.
Em conversas reservadas, integrantes do centrão já tratavam com o Planalto a divisão de ministérios após uma eventual vitória de Lira. Nas negociações, eram discutidas indicações para os comandos de pastas como Turismo, Educação, Minas e Energia e a Secretaria de Governo.
Para a Saúde, mesmo em meio à pandemia do coronavírus, o presidente avaliava retirar o general Eduardo Pazuello e nomear o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR). O assunto, segundo assessores palacianos, foi abordado no final do ano passado em reunião no Planalto.
Para o lugar do ministro Onyx Lorenzoni, que hoje comanda a Cidadania, a ideia era nomear um indicado do Republicanos, sigla a qual se filiaram dois filhos do presidente: o senador Flávio Bolsonaro (RJ) e o vereador Carlos Bolsonaro, do Rio de Janeiro.
Com o anúncio do PT feito nesta segunda-feira, Baleia conta agora com o apoio de um conjunto de partidos que soma 278 parlamentares. Já Lira tem o respaldo de siglas que totalizam 206 parlamentares.
Para vencer a eleição, marcada para o início de fevereiro, é necessário ter o apoio mínimo de 257 parlamentares. A sinalização de apoio, no entanto, não significa a adesão completa da bancada da sigla à chapa eleitoral.
Isso porque elas só se tornam oficiais após o registro da candidatura, na véspera da votação, e podem mudar de postura até lá. Além disso, o voto é secreto, podendo haver traições de deputados à decisão oficial da bancada.
Nos bastidores, por exemplo, já são contabilizadas traições em legendas como PSL, PC do B e até mesmo no PT, entre aqueles que votaram contra o apoio a Baleia na bancada do partido.
A um mês para a eleição legislativa, a equipe ministerial tem, em conversas de bastidor, se dividido sobre o apoio de Bolsonaro ao líder do centrão. Na cúpula militar, e até mesmo no núcleo ideológico, há integrantes que não escondem simpatia por Baleia, apesar de rejeitarem Maia.
A posição unânime, contudo, é de que agora Bolsonaro não pode abandonar Lira, gesto que irritaria o centrão e poderia fomentar retaliações contra o presidente e a pauta do governo, sobretudo a econômica.
A estratégia é que Bolsonaro siga declarando apoio público a Lira, mas que a articulação política mantenha, em caráter reservado, contato com Baleia. O diálogo, segundo relatos feitos à Folha, tem sido capitaneado pelo ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos.
O general tem uma boa relação com Baleia e simpatia pelo deputado. Apesar de Bolsonaro ter como principal objetivo neste início de ano derrotar Maia, o ministro da articulação política já foi mais de uma vez elogiado pelo atual presidente da Câmara.
Antes de Bolsonaro declarar apoio a Lira, militares do governo chegaram a defender ao presidente o nome de Baleia, já que o MDB teve uma série de posições favoráveis ao governo em votações importantes e hoje tem integrantes do partido nos postos de líder do governo no Senado e no Congresso.
A resistência a Lira tanto entre militares como entre ideológicos deve-se, sobretudo, à pressão do bloco do centrão por cargos no governo, com o objetivo de oferecê-los como moeda de troca por votos na disputa legislativa. Em conversa reservada, o próprio presidente já se queixou sobre o apetite do centrão.
Recentemente, segundo relato feito à Folha, integrantes do centrão levaram ao Planalto uma lista com cerca de 500 cargos. A ideia é que os postos fossem oferecidos a partidos indecisos para assegurar apoio ao candidato de Bolsonaro.
O receio do governo é que a exigência por cargos seja uma prática permanente durante uma eventual gestão de Lira, o que deixaria Bolsonaro, nas palavras de um assessor palaciano, em situação de chantagem ininterrupta.
Um aliado do governo define Lira como o “novo Eduardo Cunha”, em uma referência ao ex-presidente da Câmara que autorizou a abertura de processo de impeachment contra a então presidente Dilma Rousseff (PT).
Antes de instaurar o processo, que levou ao afastamento da petista, o deputado federal do MDB fez ameaças contra o governo em troca de apoio no Conselho de Ética da Câmara.
Segundo integrantes do centrão, o grupo de Lira até tentou impedir uma candidatura de Baleia. De acordo com relatos feitos à Folha, houve uma ofensiva sobre o MDB do Senado para forçar a desistência do deputado, iniciativa que acabou fracassada.
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