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Consignado de aposentados é recorde e governo quer evitar abuso

Toda vez que o aposentado Fábio de Melo Campos, 82 anos, vai receber sua aposentadoria no quarto dia útil de cada mês, já sabe que a palavra mais dita por ele no caminho até chegar à agência bancária da Caixa será “não”.

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A recusa às várias propostas de consignado que recebe no percurso de representantes de bancos concorrentes e do próprio banco estatal é feita não só pessoalmente, mas também por telefone e por correspondência. Campos já até pegou um consignado de R$ 8 mil, há seis anos, para pagar uma dívida bancária mais cara, mas agora persiste em resistir às ofertas de crédito. “O que ganho já não é muita coisa, se tiver um desconto do empréstimo, não consigo pagar minhas contas, meus remédios”, afirma.

Ele é apenas um exemplo do assédio de bancos a essa clientela, que levou as dívidas de aposentados e pensionistas do INSS no crédito consignado a bater recorde em 2019. Ao todo, foram R$ 138,7 bilhões, 11% de aumento em relação ao ano anterior.

O governo tenta agora evitar que a prática seja usada de forma abusiva e trabalha para diminuir o custo desse tipo de empréstimo no cenário atual de queda dos juros básicos. O saldo da carteira de crédito cresceu R$ 13,5 bilhões ao longo do ano passado. Como o desconto é feito direto nas aposentadorias e pensões, o patamar dos calotes acima de 90 dias é um dos mais baixos do mercado – fechou 2,6% em 2019.

O problema está sendo discutido pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia e pelo Banco Central.

Segundo o R7, no início de janeiro, entrou em vigor um modelo de autorregulação dos bancos. Novas medidas estão em estudo para fomentar mais a competição e reduzir os juros de modalidade de crédito, que é uma das mais baratas do mercado, mas continua com custo elevado no cenário de queda da taxa básica de juros, hoje em 4,5% ao ano.

Em 2019, a taxa média dos consignados para os aposentados do INSS fechou em 22,2%, com queda de 3,1 ponto porcentual. Para os servidores públicos, a taxa do consignado fechou o ano passado em 18,2%, de acordo com dados do Banco Central.

Um grupo de trabalho interministerial foi criado no ano passado, com a participação dos ministérios da Justiça e da Economia, da Dataprev, do INSS e do BC, para discutir propostas para aperfeiçoar o consignado. Uma auditoria foi contratada para descobrir de onde vazam os dados dos segurados do INSS que vão se aposentar. O vazamento é um problema comum e ocorre antes mesmo de o segurado se aposentar, quando já começa o assédio dos bancos para ofertar empréstimos.

Outros órgãos do Ministério da Economia têm buscado estratégias para reduzir o custo de empréstimos consignados. Em novembro do ano passado, integrantes da Subsecretaria de Competitividade e Concorrência em Inovação e Serviços foram ao Rio de Janeiro conhecer uma iniciativa da Marinha, que disponibiliza a seus servidores um “leilão reverso” de consignado, em que os bancos têm 24 horas a partir da contratação do crédito para oferecer lances com juros ainda menores e baratear a parcela do empréstimo.

Superendividados

O secretário Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça, Luciano Timm, disse que vai intensificar a fiscalização das regras de autorregulação acordadas com a Federação Nacional dos Bancos (Febraban). Segundo ele, a concessão irregular de empréstimo consignado a aposentados é um dos fatores que potencializa o superendividamento dos idosos no Brasil.

Um acordo já foi assinado entre o Ministério da Justiça e o INSS para ampliar a fiscalização dos abusos. Esse é um dos temas de maior reclamação no órgão.

Procurada, a Febraban afirmou que ela e os seus associados não endossam, pelo contrário, combatem práticas que estejam em desacordo com a legislação vigente.

Saiba como evitar problemas com o consignado

. Nunca entregue o cartão ou a senha do banco a terceiros, nem mesmo para parentes e amigos.

. Em caso de perda, furto ou roubo, a pessoa deve fazer imediatamente um boletim de ocorrência, para se resguardar de eventuais fraudes no benefício.

. Para contratação, é necessária a apresentação dos documentos pessoais do aposentado ou pensionista na instituição financeira escolhida como documento de identidade ou Carteira de Habilitação (CNH) e Cadastro de Pessoa Física (CPF).

. Além disso, é obrigatório que o contrato seja assinado pelo próprio segurado.

. O empréstimo, de nenhuma maneira, pode ser concedido por telefone, sem o comparecimento do segurado ao banco ou financeira. . Caso exista interesse na contratação do consignado, o segurado deve procurar bancos ou financeiras para obter a modalidade.

. O segurado nunca deve passar informações pessoais e de benefícios por telefone, pois este tipo de conduta pode facilitar a ação de criminosos e acarretar em fraudes no benefício.

. No telefone, o cuidado deve ser redobrado. Além de não fornecer dados pessoais, não se deve contratar nenhuma espécie de empréstimo.

. Ao decidir contratar um empréstimo consignado, é importante que o segurado vá pessoalmente até uma agência bancária ou à instituição financeira credenciada.

. É importante que se entenda todas as cláusulas do contrato, como o número de parcelas, valor, taxa de juros e o custo total a se pagar pelo empréstimo contratado.

. O aposentado ou pensionista pode optar também por solicitar em agência do INSS o bloqueio do benefício para a contratação de empréstimos.

. O segurado que for vítima de algum golpe ou detectar irregularidades nos descontos em folha deve cadastrar imediatamente sua manifestação na Ouvidoria do INSS por meio da Central de Teleatendimento 135 ou pelo Portal.

Foto: Pedro Franca

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